Sexta-feira, 27 de Fevereiro de 2009

Tempo sem tempo

Levanto-me e já não o faço com a ligeireza de outrora. As costas vergadas e doridas gritam a plenos pulmões, não sei se vergadas do colchão ou dos anos ou de tudo junto.

Vou até à casa de banho. Olho-me no espelho e ele, sem piedade revela na cara daquela que me retribui o olhar, algumas rugas e outras marcas que o tempo gravou. Bem, não sei se foi bem o tempo que as gravou, pois as rugas são efeito dos trabalhos, das canseiras da vida e da labuta diária.

Há muito tempo que não me dou bem com esse outro eu que aparece diariamente do outro lado do espelho e me estampa na cara outra cara, todos os dias igual, todos os dias diferente. Mais cansada, mais baça, mais triste, menos bonita, que é uma forma atenuada de dizer mais feia. É mesmo impiedoso, este outro eu.

Arrasto-me até ao chuveiro e a água quente faz-me acordar e restitui-me alguma energia, às vezes fazendo-me esquecer a imagem do espelho. Quando estou mesmo bem disposta, cantarolo desafinadamente.

Outras vezes fico a matutar onde teria ido parar aquela jovem que aparecia há uns anos no outro lado do espelho. Evaporou-se por aí, sem ter pedido autorização para partir. Sem ter sequer avisado que se ia ausentar para sempre. Perdeu-se, a pouco e pouco, tal como se perdem as folhas das árvores no Outono. Mas, ao contrário delas, que nascem de novo na Primavera, nunca mais voltará.

Eu fui mudando, não só por minha vontade, mas também pela força das circunstâncias. Digo isto porque as circunstâncias têm sempre muita força, muito mais do que nós. Deixei para trás as intenções que tinha de conseguir mudar o mundo e mudei eu, adaptando-me ao mundo.

Fico a pensar em tudo o que vivi e penso se tudo terá valido a pena. Perdi algumas coisas. Ganhei outras. O importante, verdadeiramente, é a forma como valorizamos o que ganhamos e desvalorizamos o que perdemos, não lhe dando grande importância. Colocarmo-nos um pouco de lado, deixar passar e não nos pormos no centro de tudo.

Uma simples flor pode valer um milhão, se nos fizer sorrir. Um sorriso de criança pode valer uma vida e eu já vi tantas crianças sorrir... Também já vi chorar algumas.

Há dias em que aceito a vida tal como ela é e deixo que o tempo passe por mim e leve o seu sopro para onde quiser. Às vezes nem sequer me apetece comunicar, o tédio toma conta de mim e só me apetece afastar-me de toda a gente. Outras vezes é o contrário, arrumo tudo o que me aflige no armazém da memória, geralmente na gaveta da nostalgia, e tenho sede de viver verdadeiramente. O importante é manter o equilíbrio entre essas duas formas de encarar a vida. Porque é no equilíbrio que reside o segredo de tudo. E já que a imagem de outrora nunca mais me retribuirá o olhar no espelho, é aprender a conviver com a actual. Que remédio!

publicado por daplanicie às 08:36

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Quinta-feira, 26 de Fevereiro de 2009

Medo

Muitas vezes tenho uma sensação estranha, como que um pressentimento, de que alguma coisa irá correr mal brevemente. É um medo que se entranha em mim e ao qual tenho dificuldade em fugir, embora me esforce sempre por não o mostrar e o tente superar rapidamente. Ás vezes, talvez para me consolar a mim própria, penso que o medo é irmão da esperança. Isto que eu acabei de dizer, talvez pareça um absurdo. Será?!...

O pensamento, às vezes, é um vento que sopra desordenado, sem nexo nem lógica e nós compreendemos que, aquilo que acabámos de pensar não tem lógica. Mas, para compreendermos o que pensámos, é necessários organizar o pensamento logicamente, analisando o que pensámos. O medo assusta-nos, por vezes tolhe-nos os movimentos, prende-nos ao chão, retira-nos as forças, bloqueia-nos os movimentos, retira-nos as capacidades. Outras vezes dá-nos forças que desconhecíamos, impulsiona-nos, empurra-nos, imprime-nos velocidades, aclara-nos os pensamentos. Catapulta-nos.

A esperança, essa não tem nada de negativo. Sendo que negativo aqui é considerado aquilo que nos tolhe. A esperança é sempre alegre. A esperança canta e dança na nossa cabeça, pula e brinca na nossa frente, chama-nos, abre-nos caminhos, constrói-nos castelos, cria-nos ilusões, dá-nos novas forças, traça-nos projectos.

Então, o que eu penso não faz sentido!... Mas eu penso-o . Se não faz sentido porque é que eu o penso?

Quando é que sentimos medo? Quando ainda temos esperança. Medo e esperança convivem no mesmo espaço e no mesmo tempo pessoal. Temos medo quando temos alguma coisa a perder: O Amor; os que amamos, a saúde , a segurança, o emprego, os bens; a Vida. Algo que queremos conservar. O medo é, assim, o sentimento da perda possível. É a posse ou a perspectiva da perda dessa posse que nos provoca medo. Quem não tem nada a perder não tem medo. Mesmo os condenados à morte continuam a ter medo enquanto têm vida. Por isso se diz “ enquanto há vida há esperança”
Teremos de perder o medo?... Não!
Só há medo enquanto há esperança. Por isso, ultrapassemos o medo e agarremos a esperança.

publicado por daplanicie às 08:52

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Quarta-feira, 25 de Fevereiro de 2009

Números

Todos sabemos que os portugueses são conhecidos pela sua veia fatalista. Todos sabemos também que ser pessimista, saudosista, gostar de fado, não acreditar em nada que seja nosso, gostar de comprar tudo o que é feito lá fora ainda que seja pior do que os portugueses fazem, são características que nos vêm de muito longe, talvez desde que verificámos que a Índia não nos enriquecia, e que nos estão coladas como parte da nossa pele.
Porém o problema actual não é infelizmente apenas uma característica. O pessimismo e fatalismo actuais que se vêem espelhados na face da maioria dos portugueses estão directamente relacionados com os números com que nos bombardeiam diariamente. 

Esses números falam da quebra do poder de compra e da quebra do consumo daí resultante. Os números falam da diferença entre a média dos salários nacionais e a média europeia. Os números falam do maior custo de vida em Portugal do que a média europeia. Os números falam de muitos milhares de pessoas portuguesas que passam fome. Os números falam da falta de cuidados de saúde e da espera por cuidados que deviam ser imediatos. Os números falam de creches a fechar e nenhuma a abrir. Os números falam de cada vez mais portugueses sem emprego. Os números falam dos lucros desenfreados da banca e das grandes companhias de serviços necessários e seguros. Os números falam do défice descontrolado, apesar do governo nos querer tapar os olhos vendendo o que outros anteriores tinha guardado. Os números falam de corrupção que se estende pela sociedade portuguesa como uma epidemia de tuberculose incurável, misturando política com futebol e negócios imobiliários. Os números falam da compra sempre crescente de carros e iates de luxo, o que é atentatório à dignidade de quem paga impostos. Os números falam-nos em tantas coisas que nos deixam envergonhados quando falamos com estrangeiros.
Há uns tempinhos atrás anos estávamos de “tanga”, mas agora estamos mesmo completamente a nú.
Será que ainda alguém espera que os portugueses tenham vontade de rir? Não se deixem iludir pelas imagens transmitidas nos dias de Carnaval. Vejam antes as imagens dos restantes 362 dias do ano...

publicado por daplanicie às 12:46

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Quinta-feira, 19 de Fevereiro de 2009

Escrever por escrever

  Escrever faz parte de mim. Às vezes não tenho assunto ou até não me apetece muito. Mas depois chega um dia em que o que está cá dentro tem que extravasar e eu tenho que pôr as "ideias a arejar". Ás vezes apenas me apetece escrever por escrever.

Escrever por escrever pode parecer uma ilusão, uma perda de tempo, consumo de energia fútil ou desperdício de imaginação. Pode até parecer o mesmo que discutir sem adversário ou conversar sem assunto. Mas, para mim, escrever é um exercício gratificante, sinal de vitalidade.

A procura do sentido do que se escreve e a harmonia do texto é um exercício de construção, de escultor que modela a peça, de pintor que se matiza nas cores. Escrever faz jorrar uma energia que não pode ser contida.

Quem escreve vira-se do avesso, exterioriza o que lhe vai na alma, na memória, nos sentidos. Coloca na escrita, ainda que não pareça nem ele disso mesmo tenha consciência, pedaços de si próprio, partículas do seu eu que, ao longo da vida, foi construíndo. Cada frase é parte do seu todo, cada letra é uma gota de sangue que lhe corre nas veias. Escrever como simples exercício pode ser interessante, bonito e estimulante pela capacidade de escolher as palavras, organizá-las numa frase, dar-lhe sentido, estabelecer as suas relações, aplicar o adjectivo que melhor se adequa, utilizar o verbo que melhor descreve a acção, dar cor ao texto, dar-lhe som, musicalidade, imprimir-lhe convicção, apelo ou imposição, ordem ou súplica, blasfémia ou oração.

Cada texto é um grito, uma ruptura com a solidão, uma brecha na muralha que tantas vezes construímos à nossa volta mesmo sem darmos por isso. É um brado de liberdade. Liberdade de fazer o que se quer, o que se deseja. De dizer o que nos enche por dentro.

Pode não atrair muitos leitores, pode não agradar a parte ou totalidade deles mas é obra, é criação. Ainda ninguém deixou de fazer um filho por pensar que pode sair feio, ou deixou?! Mesmo escrever por escrever, no meu ponto de vista, é sempre melhor do que não escrever

publicado por daplanicie às 08:32

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Quarta-feira, 18 de Fevereiro de 2009

Egoísmo

Creio que ninguém duvida que ter filhos é uma benção. Creio também que qualquer pessoa com um mínimo de sensibilidade imaginará facilmente o sofrimento dos milhões de casais inférteis por esse mundo fora. Pessoas com todas as condições, afectivas e não só, para poderem dar um lar digno e amoroso a uma criança mas que, por um capricho do destino, se vêem impedidos de tal.

Por isso mesmo me sensibiliza muito a sua luta para conseguirem ter a tão desejada criança. Os inúmeros tratamentos a que se sujeitam, gastando o que têm e o que não têm, já que da comparticipação prometida pelo estado ainda não houve vislumbre para, muitas vezes, a esperança se transformar em desgosto cada vez mais profundo a cada mês, a cada ano que passa.

Por isso mesmo me sensibilizou há dias uma reportagem que li sobre uma senhora americana que se tinha submetido a um tratamento de infertilidade, tendo conseguido a tão desejada gravidez de onde resultaram oito gémeos.

Fiquei a imaginar qual teria sido a reacção de uma mulher que, após desejar tanto um filho, se vê a braços não com um mas sim com oito bebés. Se um dá trabalho, imaginem só... Mas certamente todo esse trabalho seria compensado pela felicidade de ter atingido um dos seus sonhos.

E então, ontem, li outra notícia sobre a dita senhora, mamã babada dos oito filhotes. Vinha a mãe dela dizer que ela já tinha seis filhos e que era ela mesma (avó) que os estava a criar por falta de condições da mãe das crianças. Para além disso moram todos em casa dela e os rendimentos não são nenhuns vivendo toda a gente à custa da pobre senhora que se afirmava desesperada porque o dinheiro já mal chegava para tão numerosa família, quanto mais agora com a despesa acrescida que mais oito crianças vêm trazer.

E pergunto-me eu o que passa pela cabeça de certas pessoas para cometerem tais actos que não só se reflectem na sua vida mas, muito pior, acarretam preocupações e dores de cabeça para quem nem sequer está directamente envolvido no assunto, como é o caso da avó. Que tipo de vida tem ela para oferecer a 14 filhos?! Quanto a mim parece-me uma atitude completamente irresponsável!

Há muitas pessoas assim, para quem as consequências dos seus actos pouco importam, pensando apenas nos seus desejos momentâneos e na sua satisfação imediata, mesmo que para isso tenham que prejudicar toda a gente que as rodeia. Na minha terra, a isto chama-se egoísmo.

publicado por daplanicie às 08:04

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Terça-feira, 17 de Fevereiro de 2009

Condução negligente

Ouvi ontem que o português causador da morte de uma família de 6 pessoas no Reino Unido, foi condenado a uma pena de 3 anos de prisão. E, ao contrário da maioria dos assuntos em que facilmente assumo uma posição ou dou a minha opinião, este caso deixou-me bastante indecisa sobre o que pensar.

Não posso dizer que discordo da pena, pois quem anda na estrada, principalmente os motoristas profissionais, sabe perfeitamente os cuidados que deve ter em relação ao cumprimentos do código da estrada a fim de evitar tragédias. E já todos nós assistimos a cenas de condução perigosa que nos fazem desejar nunca ter que andar nas estradas.

Talvez esta pena sirva de exemplo para toda a gente pois um lapso não serve de desculpa para o desaparecimento de uma família inteira, onde o membro mais novo tinha apenas seis semanas.

Por outro lado, todos nós que conduzimos também já tivemos num momento ou noutro alguma distracção que, na maioria dos casos, felizmente, não passou de um susto. Ou porque um dos filhos chora, ou porque entornou leite, ou porque discute com um irmão, ou porque estamos a mudar o posto de rádio... a mim pelo menos já me aconteceu algumas vezes. É impossível não nos pormos no lugar de quem passa por uma coisa destas.

No entanto, acredito que a maior pena que lhe foi aplicada é o facto de ter que viver com o que fez pelo resto dos seus dias e, a não ser que se trate de um verdadeiro monstro, é esse o pior castigo que ele terá que suportar.

publicado por daplanicie às 08:27

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Segunda-feira, 16 de Fevereiro de 2009

Aparências

E eis que o SOL surgiu em todo o seu maravilhoso esplendor e me trouxe um pouco mais de boa disposição. É mesmo oficial... sou completamente dependente do astro-rei!

Estes diazinhos amenos que já trazem um leve aroma a Primavera foram suficientes para me animar. O pior são os resquícios de constipações mal curadas que se vêm a arrastar há uma série de dias. E em consequência disso, uma série de exames médicos a serem realizados em catadupa.

Num desses exames, R-x, cheguei à clínica e dirigi-me ao balcão para que a funcionária me fizesse a ficha, já que a marcação tinha sido feita anteriormente. Deparo-me com a empregada, uma rapariga lindíssima, vestida na última moda, carregada de "jóias" que eram tudo menos discretas, uma maquilhagem  exagerada e umas gigantescas unhas vermelhas, perfeitamente cuidadas. Parecia acabadinha de sair da capa da Vogue, directamente para o balcão da clínica! Ela continuou afanosamente a escrever no seu computador e eu aguardei calmamente que chegasse o momento de ser atendida. E fiquei ali a pensar como ela daria uma óptima modelo e como era "mal empregada" num serviço chato daqueles.

Até que ela lá se dignou olhar para mim e, quando abriu a boca, desvaneceu-se tudo o que eu tinha estado a pensar. Diz a menina "Quando veio fazer a marcação não lhe "fizerem" o "rezisto"?". Isto foi apenas o início de um pesadelo de pontapés gramaticais que se sucediam a um ritmo alucinante. Saí de lá a pensar que afinal se calhar a menina não era nada mal empregada para aquele trabalho...muito pelo contrário.

 

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publicado por daplanicie às 12:53

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Terça-feira, 3 de Fevereiro de 2009

Farta de mim

Cá estou de novo, qual fénix renascida das cinzas, para deixar mais algumas linhas, ideias, sentimentos... neste espaço de que já nem sequer tenho tempo de usufruir.

Sinto-me cada vez mais saturada de tudo o que me rodeia e começo a detestar a minha própria companhia. Acho-me irritante, mal-humorada, triste quando nunca o fui e, em certos momentos, verdadeiramente insuportável.

Se pudesse, essa é que é a verdade, fugiria de mim própria para um local longínquo onde esse EU desagradável nunca me pudesse encontrar.

Mas receio que, na fuga, esse ser que já nem reconheço me perseguisse sem dó nem piedade, continuando a massacrar-me com as suas incertezas, infelicidades e dúvidas a respeito até de si próprio. E, assim sendo, de que serviria essa fuga? Apenas iria sentir-me miseravelmente em qualquer outro lugar do mundo. Embora senpre tinha tido a ingénua ilusão de que há sítios de tal forma mágicos que é impossível não ser feliz neles. Mas esses, ah, esses, nunca os consigo alcançar...

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publicado por daplanicie às 13:03

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