Mais um ano lectivo que hoje termina para mim. Não, não estou já de férias. É apenas o último dia em que vou estar com os meus alunos. Um grupo deles continuará comigo, pelo menos mais um ano. Mas os outros, os outros são passarinhos que saem do ninho e que vão voar para outras paragens.
Trabalhei dois anos com eles. Durante este tempo ri, ralhei, aconselhei, ensinei e também aprendi muito e chegou agora a hora de lhes dizer adeus e desejar "BOA SORTE". Fica sempre um aperto no peito, embora saiba que não vão para longe e que de vez em quando me irão visitar. É quase como se fossem filhos que saem de casa, cresceram e têm agora que seguir o seu caminho.
Dizia-me ontem uma aluna "A professora vai chorar no último dia, não vai? Chora sempre...". E eu fiquei a olhar para ela, que estava toda sorridente, e a pensar como ela me conhece bem. Tão bem como eu a conheço a ela. Como os conheço a todos eles. Sei tão bem o que os faz rir, os que os faz ficar sérios... O que cada um gosta e detesta.
Durante estes dois anos passei tanto tempo com eles...quase tanto como os próprios pais, que são quase como filhos para mim. E aprendi tanto com eles que é impossível deixá-los ir sem lhes dizer "Obrigada por tudo! Nunca vos esquecerei!"
De repente, ali estava ele. Bem no fundo da gaveta, misturado com postais de aniversário, cartas de amor, recadinhos passados nas aulas quando era suposto estarmos a ouvir o professor e muitas outras recordações que sou completamente incapaz de deitar fora. Era deitar para o lixo parte de mim, do que fui, e isso não consigo fazer.
Era o meu livro de autógrafos! Há anos que não lhe pegava e fiquei ali, embevecida a ler pequenas mas sentidas dedicatórias de colegas e amigos cuja amizade, jurávamos, ía ser para toda a vida. É triste dizer isto mas, ao ler alguns dos nomes desse livro, nem sequer os consegui associar a um rosto, completamente envoltos em brumas que não consegui desvanecer da minha memória. De qualquer forma foi muito bom folheá-lo e reler o que nas suas páginas estava escrito.
Realmente, os livros de autógrafos eram uma coisa mesmo especial! Recebi o meu no dia 7 de Abril de 1974, no dia em que fiz 10 anos e o primeiro autógrafo que lá tenho é o da minha professora da escola primária, andava eu no 4º ano. Dizia "Seguindo sempre por caminho recto, do longe se faz perto. Um grande beijinho da tua professora Adrilete". Talvez na altura nem tenha entendido bem o significado de uma frase tão profunda mas a verdade é que, ao longo da vida, tenho tentado sempre segui-la.
Seguem-se depois dedicatórias de amigas e amigos, enchendo páginas e páginas de sentimentos puros e sinceros como só o são as amizades infantis/juvenis.
Algumas são apenas simples rimas quase forçadas, outras comentários engraçados, outras reflexões mais sérias mas todas, todas cheias de significado. É que embora já não me consiga recordar de algumas pessoas pois já passaram 34 anos, a verdade é que na altura foram importantes para mim, o suficiente para lhes pedir o seu autógrafo.
É que eu ainda sou do tempo em que os autógrafos se pediam aos amigos e pessoas que tinham significado para nós e não a jogadores de futebol e cantores que, por grande favor (e se calhar com vontade de mandar os fãs dar uma volta...) lá rabiscam o seu nome em qualquer papelinho.
Quero ser a senhora do tempo para lhe ordenar que, ao invés de avançar, recue. Recue até chegar ao tempo em que ainda te podia ver, podia sentir o calor do teu sorriso e ouvir a tua voz que hoje ouço apenas nos meus sonhos. Quero de novo sentir as tuas mãos nos meus cabelos, tecendo longas tranças que depois enfeitavas com uma fita colorida e, olhando para mim, e dizias que estava linda. E era assim mesmo que me sentia só pelo amor do teu olhar.
Quero de novo ficar sentada aos teus pés a ouvir as histórias que repetidamente contavas e em que, de cada vez que a ouvíamos o enredo era diferente e os finais surpreendentes. Apenas para nos ouvires dizer que da outra vez não era assim. E então rias e respondias "Mas agora é...". E nós ficávamos ali, encantados a olhar para a fada boa que conseguia mudar os destinos das personagens que já conhecíamos de cor.
Quero voltar às memórias em que me consolavas com o teu abraço tranquilo quando estava triste e me dizias ao ouvido que tudo ia ficar bem.
Eu sei bem porque Deus te quis junto dele. Porque precisa de pessoas como tu para fazerem parte da sua corte de Anjos, que envia para ajudarem quem precisa.
Mas apesar disso, quero de novo o tempo em que estavas mesmo presente, em vez de te sentir apenas como meu Anjo da Guarda.
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